Nesse segundo capítulo da série "Compreendendo Design Thinking por meio da história do design" vamos contar como o Design Thinking surgiu. O autor Jon Kolko traz a explicação por um viés bem contextualizado. Em sua visão, não há um “big bang” que deu origem à abordagem, mas diversos acontecimentos ao longo da história do design que resultaram em uma maneira específica de pensar por parte dos designers, ou o que ele chama de pilares do Design Thinking:
À medida que os profissionais da área passaram a atuar em organizações, o design se tornou mais democrático. Ou seja, diminuiu-se a distância que havia entre designers e usuários/não-designers. Estas pessoas foram inseridas no processo em um movimento de participação, colaboração e emancipação. Os designers, em contrapartida, tiveram seu papel um pouco modificado, pois também se tornaram facilitadores do processo criativo. O funcionamento da nova lógica exigiu uma relação emocional e colaborativa verdadeira entre as pessoas envolvidas, o que resultou no primeiro pilar do Design Thinking: a empatia, ou seja, a aptidão para desenvolver conexão emocional com usuários/não-designers e criar uma colaboração significativa com eles, transformando-os em co-designers.
Nas décadas de 1950 e 1960, muitas pesquisas se dedicaram a entender como as pessoas resolviam problemas. Alex Osborn, por exemplo, coloca o design como uma maneira divertida, ilógica, criativa e não racional para tal. Em sua teoria, criou o famoso brainstorming – encontro de pessoas para pensar em ideias. As regras são não criticar, focar em quantidade, aceitar qualquer ideia e construir a partir delas. Donald Schön, por sua vez, entende que o pensar e o fazer se complementam e estabelecem limites entre si. A partir do seu enquadramento, o designer identifica problemas no que está criando e faz algo novo para resolvê-los, o que gera novos problemas e assim por diante. O autor Vilém Flusser também aborda o fenômeno, intitulado por ele como “dialética interna da cultura”, em seu livro “O mundo codificado”. No estudo, ele frisa a responsabilidade do designer ao desenhar soluções, já que elas virão a ser novos obstáculos no futuro. Pesquisas como essas levaram ao segundo pilar do Design Thinking: habilidade de explorar problemas de diversas maneiras, sejam lógicas, ilógicas, lineares e divergentes, com a capacidade de transitar entre elas livremente.
As décadas de 1970 e 1980 deram início ao pensamento sobre usabilidade. Com a difusão da rede de computadores nas organizações, percebeu-se que a falta de usabilidade gerava mais gastos. A solução da época foi mapear o comportamento humano em detalhes – cada tecla pressionada e decisão cognitiva – para identificar as ineficiências, o que se mostrou ser algo extremamente complicado de se aplicar. Já com a popularização dos computadores além do ambiente corporativo, outras maneiras mais interessantes de melhorar a usabilidade apareceram. Uma importante foi o teste: assistir aos usuários utilizando o produto ou o serviço ao invés de se basear em teorias para encontrar os problemas em usabilidade. Na década de 80, o protótipo foi uma ferramenta desenvolvida para melhorar o teste. A capacidade de construir um modelo de produto/serviço com o máximo valor possível e que possa ser testado com rapidez tem sua relevância até hoje. A evolução acerca da usabilidade deu origem ao terceiro e último pilar do Design Thinking: criar produtos/serviços com alto nível de fidelidade com os usuários, a partir de testes e protótipos para entender o que as pessoas querem e para entregar valor.
Ao mesmo tempo em que as ideias acima surgiram, outra perspectiva sobre o Design Thinking emergiu – o design, em sua função de resolver problemas, como um fenômeno cultural. Por meio dele é possível experienciar e otimizar o mundo em um processo que valoriza a história, o significado e a condição humana.
Existem estudiosos e designers que não enxergam o Design Thinking como algo tão positivo. Entre as críticas de profissionais relevantes, como Natasha Jen, da Pentagram, Lee Vinsel e o próprio Jon Kolko, é problematizada a maneira como se usa a abordagem (o modo de pensar do designer). De acordo com eles, um conceito complexo, natural – e desordenado, como afirma Jen – é aplicado como um método simples, engessado e alienado do contexto histórico. O que o grupo alerta é que o uso comercial do Design Thinking pode desprendê-lo da essência do design, que mescla a atitude de melhorar uma situação com foco nas pessoas, conceitos intelectuais e a ação de criar “coisas”, de fato.
"In the end, Design Thinking’s not about design. It’s not about the liberal arts. It’s not about innovation in any meaningful sense. It’s certainly not about ‘social innovation’ if that means significant social change. It’s about COMMERCIALIZATION." Vinsel, L. Design thinking is kind of like syphilis—it’s contagious and rots your brains.
“No fim, Design Thinking não é sobre design. Não é sobre artes liberais. Não é sobre inovação em nenhum sentido significativo. Com certeza não é sobre ‘inovação social’ se isso significa mudança social significativa. É sobre COMERCIALIZAÇÃO”. Tradução livre.
No terceiro e último capítulo da série, vamos materializar o que pensamos sobre o assunto com o exemplo do treinamento de Design Thinking para os servidores públicos de Boa Vista (RR), no âmbito do projeto Observatório de Gestão Pública de Boa Vista (OBV), um portal que permitirá que a população acompanhe os gastos e atividades das secretarias municipais da cidade de Boa Vista. Ah, se você quiser conferir o que vimos no primeiro capítulo “História do design – do foco no consumo para o foco no usuário” é só clicar aqui!
Texto por:
Rebeca Bissoli Silvestre e originalmente publicado no Caiena Blog.
20 . 04 . 2021
Redação Campinas Tech